kk2011

Mudanças Recentes - Buscar:



editar

Genero

vou tentar reunir algumas referências, achadas por aí, sobre o uso da palavra "gênero".
li em alguns lugares que o uso dessa palavra tem origem nos movimentos sociais de mulheres, feministas, lésbicas, que buscavam
enfatizar a diferença entre características anatômicas e comportamentos sociais (não sei se resumi bem).
por outro lado, temos visto a palavra ser usada -- mais recentemente, pelo menos -- para designar um posicionamento
pouco combativo em relação a estrutura de opressão e violência patriarcal.
por exemplo, conhecemos alguns grupos de estudos de gênero, ou mulheres que se organizam e discutem gênero, mas desconfiamos que discutir, ou
estudar, ou trabalhar com gênero não significa necessariamente uma luta de contestação e ruptura com o patriarcado,
ou que não associam essa luta (se assim a chamam)a lutas outras que funcionam como sistema: a luta anti-capitalista,
anti-racista, anti-especista e por aí vai. ouvimos, inclusive, que a palavra gênero começou a ser empregada crescentemente no lugar da palavra feminismo
depois de incentivos de agências financiadoras, como uma forma de amenizar, ou pasteurizar, ou tornar mais digerível, o tema da subjugação de
mulheres, lésbicas, gays e todas as pessoas que sofrem com o machismo. é como se gênero fosse a palavra para um tema, mas não para uma luta.

então coloco a questão: se a luta é feminista (é mesmo?) então o que são grupos que discutem gênero?

também queremos agrupar referências aos usos da palavra emancipação, que parece ter relação com o processo de libertação
de pessoas que sofrem com o sistema de opressão cristã (exemplo: emancipação dos índios).
mesmo nos dicionários, achei algum significado para emancipação nesse sentido, ligado ao cristianismo.

enfim... organizo aqui algumas referências. e aguardo contribuições! ainda não são muitas, nem muito boas.
e acho que a gente precisa prestar atenção ao histórico do uso dessas palavras, mas também ao uso atual delas.

{ sei que umas feministas como a rosi braidotti, por exemplo, recusam-se a utilizar a expressão "estudos de gênero" porque acreditam que isso despolitiza o esquema. preferem falar em estudos feministas ou estudos das mulheres. isso tem alguns porquês. o primeiro e mais óbvio tem a ver com a política na academia. os núcleos de estudos de gênero foram a princípio espaços políticos importantes para mulheres. no entanto, com os estudos sobre masculinidades esses núcleos passaram a ser espaços mistos, com maior participação de homens. daí existir essa preocupação em salvaguardar um certo nicho específico para mulheres (que tem a ver com um medo de que esses espaços sejam assimilados por um masculinismo, ou com uma disputa de poder dentro do próprio nicho de estudos de gênero). depois tem a ver com uma certa despolitização via um discurso de neutralidade: estou analizando as dinâmicas de gênero de uma tal sociedade e não estou analizando a dinâmica da opressão de um grupo por outro. falar em "gênero" não é falar em opressão ou assimetria social.}

hmmmm... talvez seja isso! gênero é um dos temas tratados pelas feministas, talvez seja isso!

[vou colocar meu comentário rapidinho depois dou um gás nele. eu acho que: gênero é uma "novidade" (meio velha, né?)
do feminismo americano, ligado à sociologia e que serve para falar de uma diferença entre a diferença sexual biológicamente dada que não existe ou não faz sentido
por si só e uma diferença social entre homens e mulheres socialmente estabelecida. o gênero, resgatado da classificação de palavras, é usado pra falar desse "sexo social", o sexo
criado. é, pra mim, uma idéia completamente colonizada de uma diferença entre natureza e cultura e se seu surgimento pode parecer revolucionário, porque ao final de contas coloca o xis
da questão numa assimetria social, numa situação de dominação, parece que seus desdobramentos apagam essa feministragem.
o que me incuca, também, é o porque. acho que o que judith butler faz com a categoria gênero, porque entendo o problemas de gênero como uma tentativa de resgatar a categoria e fazer com ela coisas interessantes, é bem bacana, porque me parece que ela introduz uma dinâmica as vezes esquecida: gênero pra ela é um verbo, um processo inacabado e inacabável de negociação com uma norma (que eu entendo como sendo flutuante, porque mediada por outras interpretações)]


referência 1

O uso da palavra gênero pode ser perigoso neste caso, pois, conforme alerta Fiorenza, a “política de gênero entende as diferenças entre os gêneros
masculino e feminino ou como fatos naturais ou como essência metafísica ou como papéis de gênero que são socialmente construídos, mas supostamente
radicados no sexo biológico”. Ver: FIORENZA (2001: 17). -- Emancipação das mulheres

Desde os tempos de institucionalização do movimento em torno de Jesus de Nazaré, as mulheres têm sofrido uma perseguição social
para se amoldarem a uma hierarquia onde o poder se concentra predominantemente em pessoas do sexo masculino. Segundo Elsa Tamez,a atitude negativa diante das
mulheres obedece à forte pressão exterior da cultura greco-romana, que via nas casas-igreja uma célula subversiva. Portanto, se continuassem desafiando a ordem patriarcal e os
valores da sociedade romana, as comunidades cristãs correriam o risco de desaparecer completamente. Por isso e por outras razões, deveria existir um ‘patriarcalismo de amor’.
Essa realidade, no entanto, não justifica nenhum tipo de opressão ou marginalização de membro algum da comunidade cristã. [28]

Com objetivo de combater esta ideologia, que ainda é forte nos dias atuais, as teólogas têm assumido, com paixão,
a tarefa de buscar, através da realidade da mulher, proporcionar metáforas adequadas para uma linguagem em relação a Deus, [29] emancipando-se das imagens masculinas tradicionais.
O realce e a descoberta de imagens femininas de Deus na tradição bíblica, pós-bíblica e até extra-bíblica têm resgatado o reconhecimento das mulheres como imagem e semelhança divinas, desenvolvendo nelas uma autoconsciência teológica. [30]
A histórica interpretação da imago Dei estritamente no sentido espiritual trouxe conseqüências graves para as
mulheres, as quais são geralmente relacionadas com corporalidade, sexualidade e tudo o que é terrestre.
[31] Por esta razão, algumas mulheres têm reivindicado, cada vez mais, a dignidade de serem plenamente reconhecidas como imagem de Deus, apesar das feministas criticarem este conceito, haja vista que muitas delas propõem uma pluralidade de imagens de Deus, não presa apenas a uma tradição judaico-cristã.


referência 2 O uso da palavra “gênero”, como já dissemos, tem uma história que é tributária de movimentos sociais de mulheres, feministas,
gays e lésbicas. Tem uma trajetória que acompanha a luta por direitos civis, direitos humanos, enfim, igualdade e respeito.

--

Desta forma, uma história feminista torna-se uma maneira de fazer a crítica da maneira como esta história é narrada e como esta disciplina atua, tornando-se um “lugar de produção do saber de gênero”.44 Para quem quer escrever esta história, trata-se de observar os significados “variáveis e contraditórios” que são atribuídos à diferença sexual. Além disso, é preciso perceber em quais contextos políticos os significados da diferença sexual são criados e/ou criticados e, então, verificar como, por exemplo, o “verdadeiro homem” ou a “verdadeira mulher” são diferentes em cada período do passado, procurando sempre se diferenciar um do outro, e ao mesmo tempo nunca coincidindo com as pessoas de “carne e osso”.


referência 3 - do texto tocando em todas as bases, traduzido no blog heresia.birosca.org

Passei toda a minha vida procurando por uma sólida definição de mulher, e um inquestionável senso do que seja um homem. Não encontrei nada, exceto vagas definições de gênero levadas por grupos e indivíduos para suas próprias finalidades.


referência 4 [mini-glossário do livro preconceito contra a "mulher" da coleção preconceitos, escrito por sandra azerêdo]
sexo/gênero: gênero é um verbo no gerúndio, produzindo seres sexuados performaticamente, através de normas constantemente reiteradas. a dicotomia que separa gênero como sendo meramente cultural, apoiado no sexo, meramente biológico é um erro, pois apenas substitui uma determinação por outra, perdendo o elemento performático de sujeitos generificados.

[dá pra ver a influência da butler, né?]


referência 5
segundo gênero para um dicionário marxista de donna haraway o primeiro registro escrito do conceito de gênero em teoria feminista é o texto da gayle rubin, the traffic in women, contido na coletanea toward an anthropology of women. alguém tem esse texto ai? eu perdi o meu. seria uma boa trazer esse conceito dela pra cá. ahhhhhhh tem em espanhol na nete aqui
mas continuando, achei bem relevante essa passagem na página 209:

A raiz da palavra em inglês, francês e espanhol é o verbo latino generare, gerar, e a alteração latina gener-, raça ou tipo. Um sentido obsoleto de “to gender” em inglês é “copular” (Oxford English Dictionary). Os substantivos “Geschlecht”, “Gender”, “Genre” e “Género” se referem à idéia de espécie, tipo e classe. “Gênero” em inglês tem sido usado neste sentido “genérico”, continuadamente, pelo menos desde o século quatorze. Em francês, alemão, espanhol e inglês, “gênero” refere-se a categorias gramaticais e literárias. As palavras modernas em inglês e alemão, “Gender” e “Geschlecht”, referem diretamente conceitos de sexo, sexualidade, diferença sexual, geração, engendramento e assim por diante, ao passo que em francês e em espanhol elas não parecem ter esses sentidos tão prontamente. Palavras próximas a “gênero” implicam em conceitos de parentesco, raça, taxonomia biológica, linguagem e nacionalidade. O substantivo “Geschlecht” tem o sentido de sexo, linhagem, raça e família, ao passo que a forma adjetivada “Geschlechtlich” significa, na tradução inglesa, sexual e marcado pelo gênero. Gênero é central para as construções e classificações de sistemas de diferença. A diferenciação complexa e a mistura de termos para “sexo” e “gênero” são parte da história política das palavras. Os significados médicos acrescentados a “sexo” se somam progressivamente a “gênero”, no inglês, através do século vinte. Significados médicos, zoológicos, gramaticais e literários têm, todos, sido contestados pelos feminismos modernos.

--

mas, na passagem da 211 pra 212...

A teoria e a prática feminista em torno de gênero buscam explicar e transformar sistemas históricos de diferença sexual nos quais “homens” e “mulheres” são socialmente constituídos e posicionados em relações de hierarquia e antagonismo. Já que o conceito de gênero está tão intimamente ligado à distinção ocidental entre natureza e sociedade ou natureza e história, via a distinção entre sexo e gênero, a relação das teorias feministas de gênero com o marxismo está vinculada à sorte dos conceitos de natureza e trabalho no cânone marxista e na teoria ocidental de modo mais geral.

--

mais adiante, falando sobre rubin:

Ela definia o sistema sexo-gênero como o sistema de relações sociais que transformava a sexualidade biológica em produtos da atividade humana e no qual são satisfeitas as necessidades sexuais específicas daí historicamente resultantes. Ela reclamava uma análise marxista dos sistemas de sexo/gênero como produtos da atividade humana que podem ser transformados através da luta política. Rubin via a divisão sexual do trabalho e a construção psicológica do desejo (especialmente a formação edipiana) como fundamentos de um sistema de produção de seres humanos que atribuía aos homens direitos sobre as mulheres que elas próprias não tinham sobre si mesmas. Para garantir a sobrevivência material, quando homens e mulheres não podem realizar o trabalho um do outro, e para satisfazer estruturas profundas de desejo no sistema de sexo/gênero no qual homens trocam mulheres, a heterossexualidade é obrigatória. A heterossexualidade obrigatória é, portanto, central na opressão das mulheres.


referência 6: texto de judith butler: sex and gender in simone de beauvoir second sex, traduzido toscamente por yo (se não me engano partes desse texto estão traduzidas na coletânea feminismo como crítica da modernidade sobre o nome de "variações sobre sexo e gênero"):

ser um gênero, seja homem, mulher, ou outra coisa, é estar engajada numa permanente interpretação cultural de nossos corpos e, por isso mesmo, estar dinamicamente posicionada num campo de possibilidades culturais. gênero deve ser entendido como uma modalidade de tomar e realizar possibilidades, um processo de interpretação do corpo, dando a ele uma forma cultural. em outras palavras, ser mulher é tornar-se mulher; não trata-se de aquiescer a um status ontológico fixo, porque nesse caso poderíamos nascer mulheres, mas ao invés disso, é um processo ativo de apropriação, interpretação e reinterpretação de possibilidades culturais recebidas.

Editar - Histórico - Imprimir - Mudanças Recentes - Buscar
Pagina modificada em 02 de March de 2009, às 17h25